quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Quando a viagem termina

Os monges em Laos
É bom viajar, na verdade, é ótimo viajar. Sair da rotina, conhecer novas culturas, sentir outros sabores, ver outras gentes. Mas nem sempre estamos prontos para imergirmos em outras formas de pensar e agir no mundo. Viajar supõe estar aberto a tudo o que se vai experimentar sem que nossas ideias e concepções interfiram em nosso julgamento, porém essa é uma tarefa árdua que exige disciplina intelectual ao longo de algumas viagens, pois ninguém aprende a viajar sem viajar várias e várias vezes.
 Ao fim de uma viagem mais longa, temos a sensação de não termos saído do lugar. Todas as descobertas recentes levam um tempo para acomodarem-se em nossa mente e passarem a fazer parte de nós. Quando voltamos para casa, é necessário um processo de auto-convencimento de que, sim, nós estivemos em todos aqueles lugares que estão em nossa memória da câmera fotográfica; que, sim, somos realmente nós que pisamos aquelas terras, que saboreamos aquelas comidas, que estivemos com aquelas pessoas.
Quando voltamos, precisamos rever nosso trajeto desde o momento em que começamos a planejar a viagem, inclusive, para compreendermos se as motivações permanecem as mesmas e se as expectativas que tínhamos foram alcançadas ou até mesmo superadas.
Criança da tribo catcat em Sapa, Vietnã
Desde os 18 anos eu viajo. Fiz minha primeira trip para Israel e Egito com três dias em Madrid. Eu fui sozinha, sem nenhum familiar. Eu falava um inglês melhor do que hoje, eu tinha vontades e maturidade diferentes. Eu nem sabia o que ia fazer da vida em relação à profissão ou qualquer outra coisa, mas quando voltei essas questões estavam respondidas e uma certeza eu tinha e nunca mais deixei de ter: eu ia viajar muito.
Um tempo se passou, fiz minha faculdade, iniciei minha carreira e casei, casei-me com um homem que havia prometido a si mesmo que viajaria muito. E juntamos nossas vontades e temos viajado todos os anos, cada vez mais longe, cada vez por mais tempo. Dessa vez, fomos a alguns países do sudeste da Ásia, com nosso inglês básico, sem agência, sem ninguém, a não ser o fruto de nossas pesquisas e muita dedicação em organizar desde os voos, estadia, transporte nos locais, como se comportar, o que esperar.
Tem gente que nos considera um tanto loucos, mas estão errados. Somos totalmente loucos, um pelo outro, e cada um pelo mundo e todo o conhecimento que ele tem para nos transmitir. Somos doidos, cada um pelos seus próprios motivos, para descobrir o que há por trás de outras moradias que não a nossa, outras culturas, que não a nossa, outros olhares, que não os nossos. Somos muito malucos mesmo pela vontade de mudança, pela desacomodação, pela insônia criativa das madrugadas que nos ajuda a pensar e perceber que não somos nem o centro do universo, muito menos da comunidade onde vivemos.
As montanhas de Sapa
Escrevo esse texto durante o voo de volta para casa. Serão 11 horas de voo, então tenho muito tempo para ler, pensar, escrever e escrever sempre me ajuda a organizar as ideias e a analisar cada uma delas. Então, não há como voltar de uma viagem da mesma forma quando do embarque para o inesperado, porque o que vivemos é só nosso, é nossa experiência e nossa mente passará a perceber tudo ao nosso redor de um outro jeito, mesmo que não queiramos.
Durante esse tempo em que estivemos fora, aprendi que a cultura tem um poder enorme sobre a vida das pessoas. Somos realmente frutos de nosso meio. Somos criação do pensamento dominante de nossa sociedade, e só quando nos empoderamos de uma consciência profunda sobre nós mesmos é que podemos romper com o que consideramos não nos fazer tão bem quanto pensávamos até então.
Senti falta de objetos banais, como ter o auxílio de uma faca para as refeições, pois só nos ofereciam colher, às vezes garfo. Senti falta de sal, e passei a odiar a pimenta. Não raras vezes, desejei um vaso sanitário, pois na maior parte dos banheiros que precisei usar só havia um buraco no chão. Também passei a dar preferência à comida industrializada em muitos locais, era a única garantia de que não passaria mal, ou tão mal, depois de comer e bebi muito refrigerante pelo mesmo motivo.
Mercado Flutuante, Tailândia
Isso tudo, principalmente no início, porque houve momentos em que poder tomar um banho frio já foi considerado um luxo, e poder contar com um sorriso de compreensão de uma pessoa acostumada com a privação me fez sentir uma completa idiota ocidental. No começo, tudo era novidade e as diferenças foram recebidas como a constatação de que o que havíamos lido a respeito era realmente verdadeiro. Com os dias passando, imergir nas comunidades, caminhar entre as gentes, tentar se fazer entender, comer da sua comida e ficar feliz pelo prato quente de sopa de macarrão de arroz e frango entre vários tipos de folhas desconhecidas era considerado um privilégio.
Ficávamos conversando sobre o podermos viajar, o termos a oportunidade que a maioria das pessoas de nossas relações jamais terá, a bênção que era ver o que vimos e experimentar o que experimentamos, mesmo quando não haviam outras alternativas. Sim, somos privilegiados, mas não nos sentimos melhores do que ninguém por isso, nos sentimos pequenos porque estamos podendo vivenciar outras realidades e perceber o quanto somos egoístas em nossos desejos diários, o quanto somos mesquinhos em não dividirmos nossos sentimentos, muitas vezes com receio do que os outros irão pensar.
Em uma viagem como a que fizemos, receios devem ser todos deixados de lado, porque a gente tem que meter a cara, tem que perguntar, tem que fazer muita mímica mesmo sendo ridícula, tem que desenhar, literalmente, o que desejamos. Quando fazemos esse tipo de viagem, classificada como exótica nas agências especializadas, temos que estar abertos a todas as possibilidades de comunicação existentes ou corremos o risco de ficarmos doentes, com fome e sem encontrarmos nossas hospedagens.
As ruas de Hanoi, Vietnã
O que os quatro países do sudeste da Ásia nos ensinaram talvez nem consiga ser externado por completo, pois cada um de nós leva consigo suas impressões e aprendizagens de acordo com sua visão e bagagem de mundo, porém há lições preciosas que podem ser nominadas e a tolerância é a maior delas. Tolerar aos outros e suas diferenças, tolerar as diversidades de nosso planeta, tolerar ideias e formas de ver o mundo diferentes das nossas (mas nem por isso erradas), tolerar os infortúnios quando esses não têm solução, tolerar as necessidades alheias (mesmo que incompreensíveis a nós), tolerar os nossos próprios limites e sabermos parar quando chega a hora de sentar, tirar os calçados e aliviar o peso dos ombros.
Quando a viagem termina, terminam também muitas lembranças recentes, muitas sensações irão afundar na realidade do cotidiano a ser enfrentado por cada um. Por isso, as fotos e os relatos existem, para mantermos a memória do que realmente vale a pena ser lembrado, para jamais deixar de ter sido aprendido e podermos olhar esses dias com a sensação pura de que valeu a pena, valeu cada calo, cada dor no corpo, cada chuva fria, cada nascer e pôr do sol assistidos, cada voz ouvida, cada pimenta detestada, cada banheiro precário... Porque “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”, afirmou o luso poeta Fernando Pessoa e queira nós termos sempre a grandeza de compreendermos a amplidão das gentes e todas as possibilidades que temos de sermos melhores agentes nesse mundão de Deus.


terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Ko Phi Phi - o paraíso dos turistas do mundo inteiro

Ko Phi Phi de manhã
Bom, falemos de Ko Phi Phi. Ilha de uma beleza estonteante, águas cristalinas que refletem o azul esmeralda nas montanhas rochosas que parecem emergir do mar, vida marinha intensa, gente alegre, um vai e vem de turistas do mundo todo que fazem do destino tailandês uma verdadeira Babel de línguas e dialetos os mais variados.
Muitas atividades para se fazer: desde passeios de barco, mergulho, snorkel, trekking, visitas às ilhas inabitadas das redondezas até, simplesmente, se jogar na areia sob a sombra de árvores frondosas para um relax. Fora a noite que transforma Phi Phi no lugar do vale tudo (pular corda de fogo na praia, beber misturas de álcool, energético e refrigerante nos famosos bukets - baldinhos - tentar a vitória no muai tai, dançar ao ritmo de kuduro, Gustavo Lima - sim!!! - e músicas norte-americanas, caminhar e se divertir nas feirinhas de souvenires e moda praia e de mergulho).

Maya Bay
Tudo lindo, maravilhoso, até se perceber que Ko Phi Phi, assim como outras ilhas da Tailândia como Maya Bay, são espaços para o turismo internacional de certa forma degradante. Desde a culinária não tão local, pois atende ao paladar da turistama como cafés da manhã e demais refeições adaptados (com omeletes, bacon e pães franceses) aos passeios de exploração de áreas de proteção ambiental, mas que, por terem sido cenário de filme famoso, acabam por receber a visita de um contingente cada vez maior de pessoas em uma orla de mais ou menos seis metros. Para descer na areia de Maya Bay tem que pagar, e o povo paga. O que há nessa praia em especial para atrair tantos aficionados por ela? Nada diferente das outras ilhas, apenas que recebeu os pezinhos de Leonardo Di Caprio no filme A Praia. E tem gente que nunca viu o filme e vai lá por essa fama.

Na Monkey Island, bichos
que bebem nas garrafas
Outra ilha pra lá de estranha como ponto turístico é a dos macacos. Monkey Island tem uma praia minúscula que só serve para receber barcos pequenos, mas apinhados de turistas. Os guias trazem bananas e outras frutas pra turistama dar pros bichos que, acostumados com esse banquete diário, não mais vão para a floresta ter uma vida apropriada à espécie. Além de comida, o povo se diverte vendo os bichos beberem água e sucos nas garrafas plásticas. São macacos pequenos, irritados, que saem mordendo quem não der o que querem. Bichos estressados pela presença constante de vários turistas inebriados com a ideia de passar cerca de quinze minutos entre macacos.

Águas verdes profundas
De resto, águas verdes profundas, uma calma inigualável ao se velejar entre as ilhas, e um pôr-do-sol de tirar o fôlego.

Ficamos quatro dias em Ko Phi Phi, e dois deles foram reservados somente ao levantar cedo, ir para a beira mar ficar sem fazer nada, lendo, cochilando, estirados nas toalhas sob a sombra, ouvindo o rumor das leves ondas transparentes, enquanto nos sentíamos os únicos donos daquele pedaço do paraíso, até o pessoal chegar e atolar a orla.

Egoísmo nosso? Sinceramente, ninguém quer partilhar o paraíso, é o tipo de lugar que só vale a pena se for, pelo menos por alguns instantes, só nosso. Das 8h às 12h se consegue essa façanha em Ko Phi Phi.
Pôr-do-sol surreal

sábado, 9 de janeiro de 2016

Dias em Bankok - Tailândia

Rua Kao Sam Road
Embora esse não seja, especificamente, um blog sobre viagens (para esse assunto sugiro o www.memoriaviajante.com), não há como deixar de falar um pouquinho sobre nossos dez dias na Tailândia. Apesar de ter sido nosso primeiro país a ser visitado no sudeste da Ásia (daqui seguimos viagem para o Camboja, Vietnã e Laos), as impressões que tivemos foram as melhores.
Após uma viagem cansativa de avião - de Porto Alegre a Lisboa, Lisboa a Dubai e Dubai a Bankok – descer na capital tailandesa foi a realização de um sonho muito planejado e esperado com ansiedade. Havíamos pesquisado muito entre blogs de viajantes e sites especializados. Fizemos toda a nossa trip por conta, ou seja, sem agência intermediando os contatos com os destinos. As hospedagens foram reservadas via o www.booking.com, os passeios, tickets de barcos e afins todos feitos no local, quando da chegada às cidades visitadas.
Em Bankok, após chegarmos no aeroporto, tem que se ir direto ao balção de imigração apresentar passaporte, uma ficha que preenchemos no avião, outra preenchida ali mesmo, no saguão do desembarque, mais o certificado internacional da vacina contra a febre amarela (obrigatória para brasileiros e que deve ser feita pelo menos dez dias antes da viagem, em qualquer posto de saúde e com a troca da carteira nacional pela internacional em algum escritório da Anvisa). Depois é tirar uma fotinho rápida na imigração e pegar as bagagens na esteira. Depois disso foi correr para o abraço de boas vindas da Tailândia. E é bem assim que a gente se sentiu: abraçados, bem vindos, esperados.
Mercado Flutuante
O povo tailandês é top. São muito calmos, pacenciosos com os turistas, explicam tudo um milhão de vezes, se necessário, sem perderem o sorriso, marca registrada do povo thai. E nós como bons falantes básicos de inglês, ou seja, restritos ao “the book is in the table” e meia dúzia de palavras relativas a números, alimentos, localização (estilo livro didático mesmo) pensávamos que a comunicação seria muito difícil, que nada. Imaginem pessoas, nem nós nem eles, sabendo qualquer idioma em comum, alguém poderia julgar que seria o caos, pânico total, mas esses momentos nos renderam boas risadas juntos, desenhos, mímicas, indicação com as mãos e a certeza de que quando se quer ajudar basta boa vontade e gentileza. Não tivemos nenhum contratempo em relação à comunicação, mesmo sendo bastante precária de ambos lados. Difícil encontrar algum tailandês que realmente domine algum idioma estrangeiro. Todos sabem palavras básicas para a comunicação com os turistas.
No mais, os templos de Ayuttaya - a antiga capital antes da guerra com a Birmânia - a própria Bankok são lugares encantadores. Fizemos muitos passeios a pé mesmo, de metrô (que é baratérrimo), de barco (meio mais rápido e que é usado como o nosso famoso busão), e de tuk tuk (bastante em conta também e uma experiência à parte).
Em Bankok ficamos em um hostel com quarto e banheiro privativos, ar condicionado, bem arejado e espaçoso, porém sem café da manhã (muitos lugares de hospedagem são assim). Mas como estávamos no bairro mais movimentdado, o famoso Kao Sam Road (famosinho pela rua de mesmo nome do filme “Se beber não case II”), ficamos em frente ao 7 Eleven, estilo tem tudo onde a turistama faz a festa e mata a fome por preços muito baixos, e várias feirinhas que oferecem frutas já descascadas e picadas, geladinhas, em saquinhos, nem damos pela falta de um desjejum no próprio hostel. Fora que o valor da hospedagem para quatro noites, o casal, saiu uma média de R$ 300,00.
Como trata-se de área militar, bem pertinho do Gran Palace, onde mora o rei e defronte ao Ministério da Defesa, estávamos em um dos lugares mais seguros, embora a Tailândia em si seja um país bastante tranquilo e sem violência.
Pra tudo precisa-se usar o dinheiro local, o bath, que custa uma média de 35 bth pra 1 dólar. É meio engraçado, pois o que mais se usa são notas de 1000 baths e a gente jura que está pagando fortunas pelas coisas, só que não. Com os dias, a gente acostuma a calcular de cabeça. Para as compras em lojinhas e feiras a regra é: pechincha. Se consegue preços incrivelmente mais baixos do que os cobrados inicialmente e o povo adora uma barganha.
Em uma das ruínas de Ayttaya
Tiramos um dia ara visitar os templos e as ruínas de Ayuttaya. São em torno de dez lugares e como só tínhamos um dia, saimos de Bankok em uma van, com o custo de 60 bths por pessoa. Ao chegarmos em Ayuttaya, alugamos o serviço de um tuk tuk de um casal pra lá de simpáticos por 200 bths a hora (a visita a todos os lugares leva em torno de 4 horas). Tem uns caras oferecendo por 1,100 ou 1,200 bths em carro particular com ar condicinado, mas tira toda a graça do passeio. Nós optamos pelo tuk tuk e curtimos muito. Voltamos a Bankok também de van, dá uma média de 1h de viagem.
Ponte sobre o Rio Kwai

Visitamos também, em um outro dia, a ponte sobre o rio Kwai, famoso pelo livro e pelo filme de mesmo nome, pois trata de uma ponte construída durante a Segunda Guerra Mundial por prisioneiros britânicos a mando dos japoneses. Durante sua construção, muitos homens morreram e a empresa britânica contratada ganhou milhões. Junto à ponte, há o Museu da Guerra com uma bela arquitetura e objetos da Segunda Guerra e da construção da ponte. A entrada é em torno de R$ 4,00 e, talvez por isso, esteja mal cuidado e organizado, mas vale a pena a visita.

No último dia em Bankok, deixamos para conhecer o Gran Palace e para essa visita tiramos o dia, pois próximo ao palácio, uma caminhadinha rápida, está o templo do Buda Reclinado, com 40 metros de comprimento e que vale pelo esplendor.
Gran Palace
Depois de Bankok, fomos para a famosa e desejada ilha Koh Phi Phi, mas sobre esse lugar contarei em outro post. 

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Viagens e viagens

Fazia tempo que eu não escrevia, pelo menos para o blog. Fazia tempo que não encontrava um computador disponível em quanto as ideias surgem. Hoje, dei sorte, enquanto organizava a papelada para a próxima viagem.
No escritório, depois da meia noite, sempre tenho muito mais inspiração, para tudo: limpar, pensar, organizar. Em meio a papeis e bloquinhos que pretendo levar na bagagem de mão, acabei parando para ler umas anotações feitas em minha primeira viagem a Portugal, um bate e volta de quatro dias num feriado de Corpus Christi. Claro que não conseguimos conhecer quase nada de Lisboa, mas foi o suficiente para que quiséssemos voltar e o fazemos todos os anos desde então. E cada vez é uma experiência nova, ao mesmo tempo uma sensação de estar em casa e viajando, tudo embrulhado no mesmo pacote.
Temos facilidades fantásticas que o trabalho de meu marido nos concede para viajar. Por ser colaborador em uma empresa aérea portuguesa, conseguimos descontos no mínimo fabulosos. Nisso, conseguimos explorar um pouquinho do mundo: Portugal, França, Itália, Suíça, Marrocos, Chile, Argentina, Uruguai... muitos estados brasileiros e eu que já havia viajado quando guria, pelos dezoito anos, emergi nas ruelas de Israel, senti os sabores do Egito e me aventurei alguns dias pela Espanha. Cada experiência única, cada lugar inesquecível, indescritível.
Agora, vamos enfrentar a viagem mais longa, por mais tempo, por um mundo totalmente desconhecido, o enigmático Sudeste da Ásia. Serão mais de trinta dias pelos quatro encantadores países: a paradisíaca Tailândia, o contrastante Vietnã, o bravo Camboja e o quase desconhecido, mas nem por isso menos atraente, Laos. As expectativas são muitas, o frio na barriga é imenso. A mala está cheia de repelentes, inseticidas, medicamentos, mas principalmente de esperança.
Não há como se aventurar por países considerados por nós, ocidentais, como exóticos sem ter esperança de que nossas vidas mudarão. Há que se esperar, sempre, que um casal maluco, que viaja sozinho, com um inglês básico, sem conhecer nada além do que suas pesquisas no Google proporcionaram, voltem de uma viagem dessas diferente. Isso porque sempre mudamos, mesmo tendo dado um pulinho na próxima serra gaúcha, não há como ser igual depois de contemplar a enormidade do mundo, das diferenças, das outras vivências.
Há que se ter esperança em mudar, em voltar mais humano, mais tolerante, mais amável, mais tranquilo, mais vulnerável ao outro (por que não) e muito mais aberto à compreensão do mundo como parte de um plano divino para a vida em abundância de todos os seus filhos.
Depois de uma viagem, se o viajante regressa da mesma forma, com a mesma alma, ele não viajou, só saiu do lugar, não aprendeu o que o mundo tem a ensinar, apenas passou pelos lugares, não esteve neles, não cheirou, não saboreou, não enxergou o que os olhos viram.
A beleza de qualquer viagem está em nos despirmos de nós mesmos, deixarmos por algum tempo nossas velhas roupas, nossas velhas posturas, nossos velhos costumes e nos inebriarmos com o diferente, inusitado e surpreendente. Quando permitimos que outros olhares nos prescrutem e nos desnudem, seja em que lugar for, aí sim, viajamos.

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Minha vida é uma sucessão de erros que dão certo

Então, a minha vida profissional tem sido surpreendente. Sempre digo que meus planos deram todos errados: entrei na faculdade de Letras desejando ser prof. de inglês, acabei como prof. de espanhol e português. Jurava que nunca daria aula em escola privada, hoje minha dedicação e coração são exclusivos à rede de escolas particulares. Depois, dirigi todo meu interesse à área da literatura, acabei cursando pós em gramática de língua portuguesa, educação inclusiva e agora coordenação pedagógica. 
Meu maior pulo está sendo dado nesse ano: participar do processo seletivo ao mestrado em Educação (que eu dizia com veemência que nunca faria) e, ainda, para linha de pesquisa em gestão e políticas públicas na educação. Sério, eu sou um monte de planos que não deram certo, mas que com certeza têm sido os melhores planos de Deus para minha vida, concretizações que têm me enchido de orgulho de mim mesma e têm me mostrado que quando deixamos Deus nos guiar nada poderá dar errado, mesmo que pensemos o contrário. E nesse emaranhado todo, tenho sido muito feliz e realizada. 
Posso dizer que encontrei meu caminho, amadureci devagar e bem alicerçada em convicções firmes e engajadas em um propósito maior do que posso prever. 
Obrigada, Pai, por ser este ser amorosamente surpreendente.

sábado, 11 de abril de 2015

Educação-salvação: uma relação a ser repensada

Não é de hoje que se discute o papel da educação como única capaz de modificar o futuro da humanidade. Porém, o tema é muito mais abrangente e profundo do que tem se mostrado até então, pois não basta haver educação, esta deve ser de qualidade e para todos.
No Brasil, há diversas ações sendo realizadas visando à expansão da oferta de ensino até que este atinja a totalidade da população nacional, seja por meio de programas, projetos, escolas de educação popular, ONGs e associações ou das escolas institucionalizadas. O que se nota é a tentativa, nem sempre eficaz e eficiente, de mudar as estatísticas atuais no que diz respeito à capacidade de os brasileiros demonstrarem efetiva educação formal, constatando seu domínio em habilidades e competências mínimas a cada nível escolar. Se esses números representam fielmente a realidade é outra questão.
O que devemos levar em conta quando se tenta estabelecer a relação educação-salvação é se somente a educação deve ser considerada a culpada pelo aumento da violência, da marginalização social, do desemprego, da falta de estrutura familiar, da falta de embasamento na formação de cidadãos autônomos, críticos de seu tempo, conscientes de suas responsabilidades, em sintonia com as novas tecnologias e exigências do mercado.

O quanto o poder público tem efetivamente feito para descentralizar o acesso à educação e o quanto os protagonistas – professores, alunos e famílias – têm se dedicado para que a educação atinja seus objetivos deve ser o mote de um debate que leve à ação concreta para a mudança que tanto almejamos. O que devemos fazer é atuar de forma orgânica para que as práticas educativas sejam efetivas em seus objetivos, para que alcancem os agentes transformadores de seu tempo: crianças e jovens desafiados a mudar, a partir de uma atuação estruturada na ciência, no conhecimento e na visão de um mundo melhor, a realidade em que estão inseridos.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

2015

O início de um novo ano tem me trazido uma série de reflexões. Nunca fui adepta das famosas listas de resoluções, mas é inevitável, nesse período do ano, deixar de planejar atitudes e ações para o ano que começa. E como li ontem em uma postagem no Facebook, para que as coisas aconteçam, os sonhos se realizem, é necessário atitude.
Como professora, a cada ano me deparo com turmas cheias de adolescentes que sonham muito, querem muito, almejam muito, mas a ação esperada para que alcancem seus objetivos raramente é vista. Creio que o imediatismo fervilhante da atualidade tem tirado de nós a capacidade da espera, a paciência que devemos empregar em um trabalho árduo e que deve ser encarado com determinação até alcançarmos o fim: o sucesso desejado. 
Não é falta de capacidade, nem inteligência, muito menos criatividade. O que tem me parecido é que se não for para agora, não vale a pena investimento de tempo e energia. Resultados imediatos normalmente carecem de qualidade e a resiliência que necessitamos obter para sermos seres humanos capazes de lutar cada vez mais só é construído através de perdas e sofrimentos, frustrações e dor. 
O que posso afirmar, com certeza, é que vale a pena a espera, vale a pena o trabalho, o foco, a determinação em busca de algo que nos é tão caro. Seja o sonho que for, uma viagem, adquirir um bem, alcançar um patamar mais alto nos estudos ou no trabalho, vale a pena o esforço. Nada supera a satisfação de ver um plano concretizado, um sonho realizado. E é esse brilho no olho que temos quando diante de nossas realizações que nos empurra para a frente, que nos dá mais força, que nos revigora e nos ensina a viver com sabedoria.
Meus desejos para 2015? Sonhos, muitos sonhos, e capacidade e determinação para realizá-los.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Avec les fleurs entre les nuages

        Há tempos não tenho publicado no blog. Outros afazeres me tomaram as horas e a vontade, pois nesse primeiro trimestre dediquei-me, quase que exclusivamente, ao trabalho. Não, não teve nada de novo em relação às séries ou disciplinas ministradas, mas quando se busca a excelência no que se faz, mudar é preciso. Mudar, reciclar, inovar, reinventar, todas palavras que dizem respeito aos momentos surpreendentes que vive nosso país. Como deixar, então, de levar essa ânsia por mudança para nosso cotidiano profissional? E por que não dizer, também, pessoal? Relacional? Confessional?
        Comecei esse ano de 2013 sem nenhuma resolução, mas nem por isso sem vontades de dar o pontapé inicial para a efetivação de uma série de desejos contidos. Um deles foi o de emagrecer. Não, eu não perdi 20 quilos e nem pretendo, mas queria muito voltar a usar as mesma roupas de antes. Continuo curvilínea (essa é boa, até eu ri), mas joguei longe 10 quilos que não me pertenciam. Adotei uma dieta muito mais natural (adeus aos refrigerantes), sem deixar de curtir as bobagens que amo, nem sair para comer uma pizza. Apenas, criei juízo e assumi que não sou mais criança. Se quero chegar aos 40 com saúde, preciso agora me acostumar a uma vida saudável e com alguns "não pode".
       Continuo no curso de francês, mesmo sendo a coisa mais dificíl até agora a que me propus. Linguinha mais sacana essa. Mon Dieu! Terminei de decorar o quarto que será de minha filha adotiva (continuamos à espera) e tenho estado às voltas com organizações da casa, após seis anos de construção. Agora, sim, começou a diversão.
        Iniciei mais uma pós-graduação, essa em linguística aplicada. Está fluindo bem, até porque adoro os assuntos abordados e leio os materiais com afinco. Porém, a grande revolução deste ano foi minha redução de carga horária no trabalho. Sei que pode parecer controverso, pois ainda há pouco mencionei minha dedicação quase que exclusiva. Mas não há nada de errado no que tenho dito, pois exatamente por reduzir o tempo de sala de aula, posso me dedicar no preparo, na busca por materiais, atividades e projetos diferentes e com mais qualidade. Assumi duas oficinas, uma de redação e outra de aprendizagem, por um curto tempo, entretanto me acrescentaram muito na experiência com o ensino dirigido. E, também, inaugurei o sarau literário com alunos de ensino médio, evento que será apresentado aos pais e demais convidados na sexta (28), à noite, e que está me deixando de cabelos brancos.
         Ah, falando em cabelos, deixei o medo de lado e pintei-os de vermelho intenso. Pois é, a maior parte de nossos desejos deixam de ser realizados não por falta de gênio na lâmpada, mas de coragem e ousadia. Nada se compara ao olhar-se no espelho e sentir a satisfação de ter feito algo há tempos acalentado, por mais superfluo que possa parecer.
         Enfim, mudanças, boa, dignas, necessárias. Sem elas, não poderíamos nos construir, não haveria processo, apenas um ser finito em suas vontades e expectativas para o futuro. Abrir a mente e o coração para inovações, mesmo que labutadas com dor, faz de nós seres humanos melhores, mais pacientes, mais tolerantes com a vida e com os outros. Outro dia, ouvi um elogio de uma de minhas coordenadoras. Disse-me ela que eu estava muito bem esse ano, que estava renovada. Pois, é exatamente como me sinto: não outra pessoa, não por ter emagrecido ou estar ruiva, muito menos por estar dormindo mais durante a semana, mas por estar realizando sonhos, pequenos, para muita gente insignificantes, mas que têm estado em meu coração por tempo demais. Não quero ver o sol se pôr sem que eu tenha a oportunidade de pedir perdão por meus erros, e muito menos sem ter feito algo que estava a meu alcance somente por falta de coragem.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

As corujas

Eu aqui, às 23h24, acordada organizando planos de aula e execução de projetos e me achando o máximo da competência por isso. Internet a mil, entro no Facebook e me deparo com várias professoras e professores on line. Todos, pelo que eu saiba, levantam cedinho para ou trabalharem ou organizarem suas rotinas que envolvem filhos, casas, alimentação, roupas lavadas, pagamentos dentro de prazos, médicos... em fim uma porção de compromissos. Mas, lendo seus posts, me deparo com fotos de atividades em sala de aula, partilha de conquistas acadêmicas, links para aulas, filmes, músicas, constatação de terem conseguido terminar TCCs, artigos, pós-graduações, cursos, projetos bem sucedidos.
As redes sociais, para muitos, suga o tempo que poderiam dedicar a questões realmente importantes, para mim auxilia a manter contato com esse universo das corujas (não é a toa que é o símbolo do magistério) que pernoitam trabalhando com entusiasmo, apesar do cansaço e do outro dia. Somos um povo único, capaz de esquecer um pouco, mesmo que por algumas horas,  que existe vida em outros recantos além de nossa mente que planeja, visualiza, se expande, se concreta e viaja na busca por mais educação, mais estímulos, mais utopia. E que digam que somos um bando de loucas desvairadas, acreditando no inimaginável, sonhando com o impossível, com a inconcebível realização, continuamos acordadas.
Nós, profissionais, sim, claro, como não, trabalhamos não só com a mente, com os braços e os livros, usamos o coração embriagado pelo prazer de abrir muitas janelas àqueles a nós confiados, sejam crianças, jovens ou adultos. Todos eles, em maior ou menor grau, veem em nós, mesmo que a mídia ou a sociedade grite que não, alguém a quem, no mínimo, observar, medianamente admirar e no máximo seguir.
Por isso, somos especiais, porque enquanto nos perguntam o que deu na cabeça para sermos professores, acendemos nossas velas à noite, nos laptops e pcs, escondidinhas muitas vezes para o resto da casa dormir e continuamos sorrindo para dentro de nós mesmas, sabendo de um segredo só nosso, um segredo que nos garante sorrisos e cumplicidades: que educar transforma e que essa transformação pode, sim, salvar o mundo, mesmo que um pequeno mundo, mundo de um indivíduo só.
E na calada da noite, seguimos sorrindo com a certeza de que somos um bando, todas acreditando.

sábado, 25 de agosto de 2012

Mon amour: j'ai 34 ans.






Idade sempre foi um tema delicado para mim. Sofri ao fazer 21, ao chegar nos 30 e agora aos 34 me assusta a perspectiva dos 40. Mas tudo bem, já que tenho mesmo que fazer aniversário (e prefiro comemorar a vida à morte), aproveitemos o que a maturidade tem de bom, afinal não é só de rugas e de cabelos brancos que vive uma mulher que já passou da adolescência (embora eu não tenha cabelos brancos e adore me gabar disso!).
Contemos as alegrias, as vantagens como a de ter vida própria, casa própria que arrumo como quero, mesmo que compartilhada com o marido que, diga-se de passagem, é um madurão bem resolvido. Uso a roupa que quero e com a qual me sinto confortável sem me importar, de verdade, com a opinião dos outros. Durmo até ao meio-dia, ou mais, aos sábados. Não me incomoda o fato de pesar uns quilos a mais do que dizem as revistas de moda que deve ser o padrão para mim, os editores não me conhecem, não sabem que gosto de cozinhar, que forno e fogão me relaxam e que adoro servir bem minhas visitas e comer minhas comidas, óbvio. Tenho meu próprio dinheiro, não preciso pedir pra ninguém, oba! Não preciso me olhar no espelho planejando os mililitros de silicone que colocarei em implantes apêndices em meu corpo. Prefiro gastar o fruto do meu trabalho pelas ruas de cidades a serem exploradas e que encham minha alma de novidade, além dos livros que me contam histórias e de momentos com meu amor.
Sinceramente, aos 34 anos ando plena da vida. Claro que os medos existem, estão sempre pelos cantos, precisamos é mantê-los em seus lugares, alertas para nossa defesa e sobrevivência, mas só para isso. Nada de eles nos assombrarem, encherem o futuro de incertezas e falta de sonhos. Nessas alturas do campeonato, eu quero mais é cuidar da minha sensibilidade, da minha alma, dos meus amores, da família, do meu jardim, da certeza de escolhas bem feitas, cuidar de renovar minhas paixões e minha fé, sempre, todos os dias.
Aos 34 anos, a vida me sorri, e eu ando às voltas com uma novidade: resolvi fazer algo só para mim, só por mim, a aprender francês. Sonho antigo, daqueles de adolescente, que via filme europeu com o namorado, que achava o máximo o desenho animado da Bela e a Fera, com aquele sotaque no bonjour, no samovar, no nome de Pierre. Então, é isso, viver. E aprender, encher a cabeça de outras descobertas, descortinar os olhos para outras culturas, desvendar outros sabores e conhecer outras magias. E, no final, se dar ao luxo de visitar a França falando francês, próximo projeto a ser concluído, talvez, pelos 35, 36, 37... anos, quem sabe.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Portugal aos 11 anos

Amo viajar, na verdade amamos, meu marido e eu. Nesse ano de 2012, realizamos um sonho antigo: ir a um país da Europa. Ele trabalhando em uma empresa aérea portuguesa nos proporcionou a facilidade econômica de visitarmos a terrinha.
Foram apenas seis dias, sendo que se perde dois deles em aeroportos. Os quatro dias em Lisboa e Sintra nos brindaram com belíssimas experiências que nos aguçaram os cinco sentidos, senão seis. Se não fosse tanta emoção junta, ainda comemoramos nosso aniversário de onze anos de casamento, um casamento repleto de conquistas, companheirismo, cumplicidade, com erros sim, mas também  perdões e muito, muito, muito amor.
Foi um baita presente que recebemos. Lisboa é linda, Sintra é mágica. E voltar para casa cheia de memórias impecáveis é divino.


terça-feira, 3 de abril de 2012

Colegas II

Sei que tenho abandonado um pouco o blog, mas o trabalho tem me exigido dedicação e para escrever preciso que alguns fatores cooperem: tempo e inspiração. Hoje, não tenho tanto tempo assim, sobrando, mas a inspiração está fazendo-me doer a cabeça. Ou escrevo ou escrevo.

E escrever sobre o quê? Retomo o tema colegas, texto que publiquei aqui, emocionou algumas pessoas e que me deixou feliz por vê-las assim, pois não conheço escritor, famoso ou não, que não queira tocar os corações de seus leitores através do que escreve. Então, convenhamos, o assunto não se esgota em apenas umas linhas, pois a cada novo dia me surpreendo mais e encontro nesses seres humanos tão singulares a certeza de que eu nasci mesmo para viver no meio dessa gente. São pessoas que labutam, que levam seu dia a dia, sua profissão, com dignidade, que não se contentam em fazer o apenas cobrado, mas fazer o melhor. São homens e mulheres que conseguem equilibrar estados emocionais os mais diversos para se apresentarem inteiros ao oficio do educar. Não são hipócritas ao ponto de ostentarem a bandeira do “da porta pra dentro sou outra pessoa”, não, eles ainda sofrem ou se preocupam, ou esperam por algo, mas as emoções são comedidas, controladas, entrevistas somente nos poucos suspiros que ouvimos ao longo do dia.

Entre colegas, tenho aprendido que as relações são frágeis a ponto de alguém sabotar outro, às vezes por inveja, despeito, busca por oportunidade, mas fortes o bastante para superarem mau humores, lágrimas enxugadas às pressas, nãos bruscos, perdas familiares, separações, desafetos.

Ser colega é conseguir esquecer-se por alguns momentos e ver no outro a possibilidade da amizade, mesmo que ela dure até um dos dois ir embora ou ficarem em horários alternados. É se ter a sensibilidade de entender que por trás do uniforme tem gente como a gente. E que, assim como desejamos ser entendidos e respeitados em nossos momentos, devemos fazê-lo com os outros. E, acima de tudo, dar-se conta de que nem tudo o que se pensa é para ser dito, escarrado nos outros, simplesmente porque são obrigados a ouvir. Devemos ter a consciência de que na dor alheia não se mexe, não se toca a não ser para curar. Que sejamos, em nosso ambiente de trabalho, as mãos que curam, os ouvidos que escutam, o ombro que se oferece para o choro silencioso, a mão que afaga. Em qualquer lugar, a qualquer momento, o que nos torna mais ou menos humanos é o saber cuidar dos outros e não há melhor forma de fazê-lo do que com nossos colegas.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Dias de ócio com prazo de validade

Férias, benditas, merecidas e esperadas férias!

A maior parte das pessoas com a qual convivo, que trabalha em instituições de ensino, está se deleitando com seus dias de ócio. Nas redes sociais, fico entre curtir e comentar as várias fotos de momentos nas belas praias gaúchas e catarinenses, junto aos amigos e família, todos com largos sorrisos nos rostos. Pois é, trabalhamos tanto, suamos tanto durante o ano que esses dias só podem ser mesmo de festas.

E, embora eu não esteja viajando, também tenho descansado, sem horário pra comer, dormir, acordar, ler, rir, assistir a filmes, enfim, relaxando. Porém, assim como o sol surge todos os dias, chegará o momento de ajustar o despertador para as 6h da manhã, chegará a hora de tirar o uniforme do armário, dar uma passadinha pra fazer bonito no primeiro dia, chegará o tempo de encher as bolsas e mochilas de materiais, de sujar novamente as mãos no pó do giz, ou nas tintas coloridas dos pequenos, de pendurar o crachá no pescoço e trabalhar.

Falando assim, até parece o tão profetizado fim do mundo em 2012, porém o que podemos e devemos esperar são dias de compromisso, sim, de disciplina com horários e prazos, também, porém, de encantos, momentos de novas descobertas, de novos rostos e corações nos esperando, sentados ou em pé, tanto faz, mas estarão lá, todos no horário marcado, todos esperando...
Para alguns, o magistério se tornou um mal necessário. Aos alunos, uma obrigação imposta pelo governo e os pais, aos professores uma necessidade econômica. Entretanto, para muitos e muitos mesmo, é a oportunidade de conciliar sonho com realidade, esperança com pé no chão, oportunidade com empreendedorismo, conhecimento com vontade de saber.

Embora, todos adorem as férias, principalmente porque significa missão cumprida no ano que passou, há um momento que cansa, há um dia em que a gente acorda querendo mais do que sol e mar, não que não o desejemos mais, mas parece que falta algo, que os dias estão ficando longos demais. Os sonhos mudam, outras faces entram neles, outros ambientes, outras vontades. Acordamos, enfim, sabendo que chegou a hora de um recomeço-continuação, pois tudo é processo. Chegou a hora de voltar ao nosso lugar e de descobrir, de novo, como somos felizes com o que escolhemos para ser, com o que fazemos, com o que proporcionamos a outros fazerem, felizes com viver no mundo do conhecimento, do saber, da ciência, da cultura, do valor à estética e ao questionamento.

Tine o despertador, voltamos. Abraços e sorrisos dos colegas, entrega novamente de nossas vidas à educação.



segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Força Figo

Ninguém gosta de vivenciar uma situação de doença na família. É incômodo, perturbador e quando se trata de alguém jovem e de uma doença-surpresa, dessas que não avisam que andam a espreita, dessas que, de repente, dão as caras e mudam toda nossa perspectiva sobre a vida, é pior ainda.
Estamos, minha família, passando por mais um desses episódios que envolvem hospital, incertezas, abalo emocional, orações. Depois do câncer de meu pai, meu cunhado, marido de minha irmã do meio, com apenas 33 anos, está hospitalizado com uma síndrome rara que paralisa os membros inferiores. Ele, um desses caras-saúde, que não fuma, não bebe e joga futebol semanalmente, ele que adora seu trabalho, é motorista de ônibus urbano, que ama minha irmã e se derrete todo pela minha sobrinha de 9 anos, ele que é o melhor amigo de seus irmãos e tem o riso mais fácil que conheço, está atrelado a uma cama de hospital e ficará lá por não menos de 20 dias.
Visitando-o no sábado, pude ter a certeza de que ele é muito mais forte do que eu. Sim, está fazendo a maior piada com a situação. Entre punções e injeções na barriga, encontra tempo para fazer graça de tudo. Nos divertiu durante a meia hora em que estivemos a seu lado e nos deixou mais tranquilos quanto a fé que tem. E isso tem sido evidenciado a cada rasteira que alguém de minha família tem levado: fé, muita fé no fato de que Deus está sabendo direitinho o porquê de tudo isso.
Tanto meu pai, quanto agora meu cunhado, não se rebelou, nem se questionou sobre o que aconteceu. Eles aceitam e fazem o seu melhor enquanto pessoas que sempre professaram fé incondicional em Deus. Nada do: eu te sigo, Tu fazes o que quero.
Em pouco tempo, pude me sentir feliz por fazer parte de uma família que extrapola as ligações de sangue, que se sente muito mais ligada pela certeza em um Deus amoroso e cuidadoso, que permite que sejamos humanos, sujeitos a problemas, doenças, fracassos, dores, mas que nesse turbilhão todo nos enche de muita paz, certeza em sua presença constante, em seu amor.
Desejo, de todo coração e oro por isso, que meu cunhado se recupere logo, que mantenha sua fé inabalável, seu sorriso confiante, sua alegria que faz dele o baixinho preferido da família.
Força Cris, Deus está contigo e tu sabes disso.
Obs: Figo é o apelido do cunha.


quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Colegas: não dá para viver sem eles

Hoje, quero falar de pessoas especiais e embora não seja sobre alunos, tem tudo a ver com eles, apesar de não ser sobre família, faz-me sempre recordar dela. Hoje, vou falar sobre colegas.

Colegas são esses seres que entram na nossa vida sem convite, pois somos obrigados a conviver com eles. Não há escolha: ou aceitamos ou nos demitimos e como todos precisamos viver... abaixamos a cabeça e nos entregamos a todos eles, sem exceção, pois ela não existe.

No meio das relações profissionais, do bom dia, boa tarde, como vai, tudo bem, aparece aquele sorriso de boas vindas ao novato, inseguro e cheio de medos, mesmo entre a espuma da pasta de dente na hora da escovação, no banheiro atulhado de gente correndo entre um turno e outro.

Depois de um tempo, ou com alguns, de algumas horas, as conversas brotam naturais e um dia, num dia em que tudo parece dar errado, sentimos uma mão afagando nosso ombro e um ser, até então estranho, nos diz que vai dar tudo certo e não tanto suas palavras, mas muito mais sua atitude solidária traz o sol para perto de nós.

Já passei por várias instituições tanto de ensino quanto de comércio, há colegas que nunca mais vi e sei que não verei, há aqueles que se tornaram amigos e frequentam minha casa mesmo depois de não sermos mais colegas de trabalho, mas todos eles, independente da medida, fazem parte de quem sou.

Nesses estranhos tão íntimos é que encontramos coragem para olhar no espelho todos os dias e saber que fazemos parte de algo maior do que podemos imaginar. É com eles, com os colegas, que passamos a maior parte de nossos dias, e é deles, na maioria das vezes, que recebemos cuidado e atenção.

Foram colegas que enxugaram minhas lágrimas quando eu me sentia derrotada, foi de uma colega que recebi o abraço mais sensível de minha vida quando pensei em desistir, de colegas ouço as piadas e histórias mais hilariantes.

Tenho colegas que só de olhar para mim sabem que não estou bem. Tenho outras, abertas ao riso, que permitem que eu abra seus pacotes de biscoito e os coma antes delas, as donas.

Colegas que na carona para casa me divertem, me escutam, me aguentam, mesmo correndo perigo, mesmo tendo que gritar ‘olha o carro’, ‘cuidado’, ‘ainda bem que tenho seguro de vida’.

Tenho colegas que cuidam do meu lanche. Que me trazem guloseimas, que se dão ao trabalho de certificarem-se de que estou comendo bem.

Tenho colegas que me emprestam dinheiro para o almoço, pois às vezes eu esqueço. Outras, que me enchem de cheiros bons com seus Avons e Naturas.

Tenho colegas que abrem as portas das salas de aula quando não encontro minha chave em meio ao material que carrego, colegas que me sorriem entre os metais dos aparelhos, colegas que simplesmente suspiram e me olham.

Há também aqueles com abraço de urso, literalmente, pois quase me dobro ao meio para corresponder, mas que prefiro o desconforto momentâneo a perder a oportunidade de um carinho.

Tenho colegas anjos, colegas duendes, colegas fadas madrinhas e colegas mágicos. Todos eles, talvez sem ao menos se darem conta, colam os pedacinhos de minha existência com cola colorida. Costuram os rasgões, fazem remendos como numa colcha que espero lhes dê orgulho de olhar no final. São meus colegas, homens e mulheres, que têm me ensinado a perdoar, relevar, argumentar, esperar minha vez, me indignar, nunca menosprezar nada nem ninguém. Têm me mostrado que é possível o ser humano ser bom, apesar de ter atitudes más, pois sempre há um ângulo novo pelo qual olhar, há sempre um dia de cada vez, sempre um período depois do outro e que eles só duram cinquenta minutos. E que a vida é muito mais interessante quando compartilhada, mesmo que seja só nos vinte minutos do intervalo.


quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Ainda ouço os passarinhos

Conversando com colegas e amigos, por vezes surge o tema violência urbana. São crianças que não podem mais brincar tranquilamente nas ruas, investimentos em grades para as janelas, cercas elétricas, alarmes e câmeras de segurança. Os idosos que não podem fazer a feira, visitar os amigos e parentes. Até podem, mas sozinhos nunca. E os adolescentes? Não podem mais sair de casa sem levar o celular, sem deixá-lo ligado mesmo no cinema, na balada, no encontro. São outros tempos, dizem, tempos dos condomínios fechados.

Segurança virou item de luxo e dane-se quem não pode pagar para ter sossego na hora de ir trabalhar, estudar ou mesmo dar uma voltinha descompromissada fora de casa. Por isso, quando conto que onde moro as crianças andam de bicicleta até tarde no verão, a maioria das casas não tem grades nas janelas, as roupas ficam tranquilas no varal, há casas sem nenhum tipo de cerca, a não ser as vivas e que da minha casa posso ver as máquinas de lavar dos vizinhos, posso ver suas tevês de LCD e mais algumas coisinhas, e que não se trata de nenhum condomínio fechado, o povo me olha sem acreditar.

Mas onde tu moras???

Não moro, eu brinco, me escondo. Na verdade, meu bairro é afastado do centro da cidade, beeemmmmm afastado, digamos. Durante nove anos nem ônibus passava no residencial, antes chamado de loteamento, ficou chique e mudou de status esse ano. Aqui, lugar que é longe de muita coisa como hospital (mas tem posto de saúde, creche e locadora de filmes), bancos, grandes supermercados, parques, grandes escolas, prefeitura, padarias (o dono do mercadinho que não me leia), aqui, onde ainda existem corujas, onde os beija-flores voam espanando as flores no meu jardim, onde passarinhos me acordam de manhã, se não passarinhos, as risadas da criançada brincando na rua, onde se pode usar o notebook na calçada, tomar chimarrão com os vizinhos quase no meio da rua, onde todo mundo conhece todo mundo pelo nome, dá pra se ter a impressão de que o mundo é maravilhoso.

Então, por essas e outras, continuo não abrindo mão do sossego, de poder sair tranquila de casa, de poder ver a vizinhança crescer, vizinhança infanto-juvenil. Não abro mão de viver tranquila, mesmo tendo que fazer uma viagem de quase quarenta minutos até meu trabalho, se eu for de ônibus, sendo esse no centro da cidade. Não há preço tão alto, nos dias de hoje, que não possa ser pago para se ter paz e quando é de graça melhor ainda.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A mão que segura o pincel

Há muito que se sabe que ser professor extrapola o dar a matéria, o cumprir calendários, o transmitir conhecimento. Mas, trabalhando em todas as séries da educação básica, a que mais me surpreende, ainda, é a educação infantil.

Se alguém precisar saber o que é ser um professor na íntegra, olhe atentamente para as professoras da educação infantil, seja de que ano for. Elas não estão presas a apostilas e semanas de provas, nem precisam quantificar seus alunos. Elas não precisam fazer cara de paisagem, não precisam usar máscaras de mestres nisso ou naquilo, nem deixar de ser quem são como pessoas.
Elas são as professoras que cuidam, que fazem projetos sobre o que os alunos realmente querem aprender, exploram o mundo pelos olhos deles, levando-os a outros mundos, inclusive interplanetários.
Elas conseguem fazer com que seus alunos entrem dentro, literalmente, do corpo humano e em suas aulas podemos conviver pacificamente com os dinossauros, porque eles não estão em extinção.
Com as professoras da educação infantil o amor tem sabor de chocolate, e garrafas pet são desde aranhas teimosas a discos voadores.
Lá, na aula delas, naquelas salas enfeitadas e coloridas, cheias de letras-borboletas ziguezagueando pelo teto e as paredes, ouvem-se sons de brinquedos e brincadeiras. Lá, dá para deitar no chão, rezar antes de fazer o lanche sem sentir vergonha, pedir perdão e abraçar o amigo a cada palavra errada que se pronuncia. Lá, dá pra cantar bem alto sem mesmo saber a letra da música.
Nas aulas de educação infantil, com aquelas professoras-fadas-madrinhas, fazer xixi na roupa não dá motivo para a risada, mas para o cuidado. Chorar de mansinho a perda do brinquedo suscita o abraço. Lá dá para ser diferente, porque a diferença é exaltada e não rotulada.
Com essas cinderelas da educação, dá até para ganhar um colinho, fazer manha de vez em quando, dizer “não gosto”, “não quero”, “tô com sono” ou perguntar a todo instante “tá na hora do lanche?”.
As professoras da educação infantil são inteiras, porque educam com a alma e têm a percepção sagaz para entender quando é hora de fechar os olhos para o mundo apenas para fazer seu aluno feliz. Elas não se importam se a apresentação para os pais terminou, se um aluno não conseguiu fazer suas bolhas de sabão na hora certa, elas são capazes, e o fazem, ah se o fazem, de parar o tempo para dar a oportunidade de aqueles olhos pueris brilharem novamente.
Se crerem que estou aqui a me elogiar, ledo engano. Dou aulas na educação infantil, mas não chego nem perto da capacidade, da competência que observo todos os dias nas turmas de colegas dedicadas além de si mesmas, que realmente se comprometem com quem está ali, não só a frente delas, mas aos lados, atrás e muitas vezes, escondido embaixo das mesas.
Os primeiros anos escolares de uma criança não poderiam ser melhores do que estes, em que aprendem a olhar a escola como o lugar onde a mágica acontece, onde a fantasia se materializa, onde o conhecimento é a base para uma vida mais feliz e completa, porque as professoras da educação infantil são aquelas que não pintam pelo aluno, mas que seguram o pincel para que este não caia, para que o desenho seja concluído mesmo que seus nomes não assinem a obra prima.
Ainda não é o dia dos professores, mas depois de quase três anos convivendo com essas guerreiras, eu não poderia deixar de prestar-lhes minha homenagem. Muito do que sou como profissional aprendi com elas, principalmente a ver o mundo com mais cor.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Crônica do desespero

Se você, mesmo que por um ínfimo instante, já pensou que seu tempo neste mundo estava com prazo de validade vencido, leia esse texto até o fim, pois é sobre nós.

Hoje é segunda-feira e só isso já valeria meu mau humor, mas ele me deu uma rasteira, e se avolumou de uma forma quase palpável. Os que se aproximaram de mim, logo deram um jeito de se afastar, eu estava, de verdade, insuportável.

Levantei mais cedo que de costume, pois quebraria minha rotina com a necessidade de ir de ônibus até o trabalho. Nada contra o coletivo, ou as pessoas que dele fazem uso, mas eu odeio andar de ônibus. Antigamente, amava. Era uma viagem tranquila, em que pessoas conversavam sobre seu dia a dia, outros, os intimistas como eu, entravam em outra dimensão com seus fones de ouvido ou suas leituras recolhidas, mesmo que de um jornaleco qualquer. Era normal andar de ônibus, ir ao trabalho, à faculdade, para ver uma amiga. Hoje, é a sucursal do inferno. Em dia de chuva, então, tem-se a impressão de que não se chegará ao destino, pois será necessário descer antes.

Enquanto esperava no ponto, com a umidade a me empapar os cabelos e encharcar até os ossos, me acalmava com a ideia de fugir um pouco da responsabilidade de dirigir. Será legal, pensei. Vou poder ler em paz. Que vã esperança. Ao entrar no verdinho, me deparo, assim de cara, com um casal ouvindo uma música de péssimo gosto, sem fone nenhum, na caixa mesmo, para todos os passageiros apreciarem aquela mistura de vulgaridade e bateção de nada.

Sentei-me perto da janela, longe da balada improvisada, e tentei, juro, me acalmar. Peguei meu Carpinejar e comecei a ler. Consegui me afastar daquele mundo dos sem-respeito-pelo-ouvido-alheio e entendi e me estendi por algumas crônicas.

Cheguei ao trabalho e tudo o que ouvi desde então foi: mas que cara, tu estás com uma cara, mas o que tu tens?, tu precisas tomar alguma coisa, isso vai te fazer mal. Não, não vai, já está fazendo. Afastei-me o mais que pude, trabalhei normalmente, ser professora nos exigi fingir, participei de uma reunião curta, fui para o ponto de ônibus a fim de voltar para casa. Resolvi pagar mais, descer um pouco mais longe de minha casa só para ter a certeza de mais privacidade. Fui de lotação.

No caminho até em casa, muitos pensamentos, inclusive o de que está na minha hora mesmo de ir para outro mundo, porque esse me parece estranho demais, mundo em que as pessoas não reconhecem mais limites, não entendem que há momentos em que se deve respeitar o silêncio, ou pelo menos, abafar os seus próprios sons, pois eles são particulares, não são para os ouvidos de todo o mundo, simplesmente porque pode o todo mundo não suportar o seu som, o seu gosto pelo seu som, mas não tenho como dar o salto mortal, pois amo demais a vida que tenho, mesmo precisando pegar o ônibus toda a segunda-feira para meu marido poder ir à faculdade com segurança. Além disso, não tenho coragem, tenho é curiosidade para saber o que acontecerá daqui a pouco. Não quero perder essa novela tão boa que é a da minha vida e como cortar os pulsos é muito dolorido, não tenho arma, nem veneno e minha casa só tem térreo, sigo vivendo e esperando para ver que outra doideira o mundo vai inventar. No final das contas, no caminho para casa depois de descer do ônibus, passei na padaria, comprei um pacote de meu salgadinho preferido e uma caixa de Bis e estou aqui a me compensar, afinal, venci mais um dia que havia dado a entender que terminaria horrível, mas está repleto de sabor, ao meu som, sem incomodar ninguém.

Desespero mesmo só o que continuo tendo pelo meu carro. Que chegue logo a terça-feira.


quinta-feira, 23 de junho de 2011

Feriado, chuva e história

Feriado de Corpus Christi e eu gripada, de novo. Lá fora, uma chuvinha de inverno. No primeiro momento do dia, pensei que passaria deitada, à base de chá e fungação.
Mas, à tarde, eu já encarava a faxina que havia planejado. Faxina de minha história: tirei algumas horas para organizar as caixas de documentos, fotos e
cartas.

Cartas, sim. Cartas que foram escritas durante mais de dez anos entre mim e meu marido, desde o início de nosso namoro. Na primeira que peguei, a emoção já me tomou. Era a que eu havia escrito em comemoração ao nosso primeiro ano juntos. Enquanto eu lia, ao som, coincidentemente, de uma de minhas músicas preferidas de Lenine, Paciência, não me aguentei e chorei. Encontrei naquelas linhas, escritas com esmero, uma paixão avassaladora, de alguém que, aos dezenove anos, acreditava em um amor para a vida toda. Cada palavra parecia escolhida para demonstrar sentimentos muito verdadeiros, muito puros, cheios de esperança em uma vida maravilhosa, cheios de sonhos ao lado de um homem maravilhoso.

Mas minhas lágrimas não foram motivadas nem pela trilha sonora, nem pela nostalgia, mas pela certeza, absoluta, inconfundível, de que eu, hoje, passados 14 anos, não mudaria uma palavra sequer. Diria tudo novamente, exatamente como ali naquela antiga carta.

Chorei pela comprovação de que minha paixão daqueles primeiros anos não arrefeceu, mas tornou-se um amor seguro, forte, decidido; chorei porque o amor em que eu acreditava naquela época me provou ser insuperável, vitorioso e senhor de meu coração; porque minhas esperanças não foram vãs; porque meus sonhos ao lado de um homem maravilhoso, o mesmo destinatário daquela carta, têm, todos eles, se cumprido por ele, para ele, para nós.

Guardo cada uma das cartas, cartões, marca-páginas e recadinhos que nos trocamos desde que nos conhecemos. Li alguns hoje, enquanto organizava-os em uma nova e mais ampla caixa. Toda nossa história de amor está ali, cada desafio superado, cada pedido de perdão, cada confissão de amor eterno, cada desejo, cada pedido. E não sei por quanto tempo essa nova caixa dará conta de todas essas palavras e promessas porque nossa história não acabou, continua sendo escrita e compartilhada, continua tendo sonhos, esperanças, declarações de amor. Nem todas registradas em cartas, mas todas sentidas, expressadas por nossos olhares, nossos toques, nossas descobertas e cumplicidades.

Não há caixa que comporte tanto amor, tanta certeza de estar ao lado da pessoa certa, do amor certo, para a vida toda.


sábado, 26 de março de 2011

Promessa

Dia desses, numa aula de português, comentei com meus alunos que escreveria um texto sobre eles no meu blog. Bom, estou aqui para isso. Trata-se de minha turma do segundo ano do ensino médio. E o assunto surgiu depois que comentei sobre uma música que eles me haviam sugerido.
No início do ano, passei uma lista em todas as turmas para que pudessem sugerir músicas, filmes e livros para estarmos explorando em nossas aulas. Além de me mostrar um pouquinho do que eles gostam, também me ajuda a conhecê-los melhor.
Semana passada, sentei ao computador para buscar vídeos das músicas sugeridas e me deparei com letras bastante questionadoras, que buscam respostas para os conflitos da sociedade, que apontam a mudança para um mundo melhor, letras que me fizeram admirar ainda mais meus alunos.
E, na aula, quando entreguei a letra da música a eles, vi suas reações animadas. Algumas meninas me perguntaram se eu também gostava da banda que cantava aquela música. Não, meus amores, a profe não gostava, porque não conhecia. Foram vocês que me mostraram algo novo, novo e muito, muito bom.
Conversamos a respeito da letra. Ouvimos a música (sim, eu baixei o vídeo do youtube). E me senti mais próxima de meu queridos.
Por isso, cada vez mais fico pensando nas pessoas que dizem, que afirmam com "tanta propriedade", que adolescente não pensa, que age por impulso, que não sabe o que é certo. O que meus alunos e alunas do ensino médio, não só do segundo ano, mas do primeiro e do terceiro, têm me mostrado é que pensam sim, e muito. Eles discutem a sociedade, questionam suas ações, sabem muito bem como salvar o mundo, como buscar soluções, como buscar ser feliz. Admito que, às vezes, agem por impulso, mas isso faz parte da construção de suas histórias e agir por impulso não é privilégio de adolescente, tem muito "senhor" que faz o mesmo.
O que posso, então, como educadora, fazer por eles, já que sabem tanto? Posso mostrar-lhes como passar pela vida sem que o sofrimento marque tanto, posso ensinar-lhes o que devem saber para terem melhores posições no mercado de trabalho, posso adverti-los de que o mundo pode ser muito cruel, mas se estamos preparados, com as ferramentas certas, podemos vencer. Posso ensiná-los a gramática que ajuda no concurso, que faz conseguir muitos pontos no ENEM. Posso ajudá-los a se expressarem melhor, a colocar suas ideias de forma a convencer. Posso mostrar-lhes que há muitos mundos por aí, através da literatura. Mas isso tudo faz parte de minha profissão, de quem sou para eles, a profe. O que eles têm me ensinado faz parte da vida deles e isso não tem preço.